O Bom, a ASAE e o Vilão

Não embarco no discurso de que a ASAE e a sua acção mediatizada têm prejudicado o pequeno comércio. Embora, em parte, exista um fundo de verdade na designada área da restauração, há, por outro lado, todo um conjunto de actividade económica que tem obtido significativos dividendos nesta época de estagnação económica. Desde a malta do inox até aos vendedores de produtos de higiene e limpeza, passando pelo lobby do plástico e das consultoras, muita gente tem enchido os bolsos ajudados pela Autoridade acima mencionada.

Nada tenho contra o facto de certas pessoas encherem os seus bolsos, mesmo que isso acarrete o vazar dos bolsos de outros cidadãos. O sistema capitalista é assim mesmo e este dinamismo e circulação de capital até é benéfico para a sociedade no seu todo. Já discordo por completo, quando se ganha dinheiro de uma forma que roça a ilegalidade.

Vamos aos factos:
1. Um familiar, Sr. X, idoso, já reformado, proprietário de uma daquelas mercearias de aldeia com clientela fiel e livro de “aponte” recebe a visita do Sr. Y, representante da empresa com designação anglo-saxónica – “XPTO Portugal”. Comercializa o detergente Z “que agora é de utilização obrigatória por causa da ASAE“.

2. O Sr. X, atendendo a tal informação presta-se a adquirir o produto – detergente concentrado germicida e bactericida. Um garrafão de 5 (cinco) litros pelo preço (já com um desconto comercial) de aproximadamente 120 (cento e vinte) Euros.

3. Passado uns dias, recebe a encomenda, com a respectiva factura, uma ficha de segurança, onde costa a identificação do produto, composição química, identificação dos perigos, actuação em caso de primeiros socorros, entre outras. O documento informa também que o produto é fabricado por empresa com sistema de qualidade e certificada pela APCER, fazendo ainda referência ao número do processo de certificação.

Vamos aos argumentos:
1. Hoje, quando se pronuncia o nome de “ASAE“, cria-se um clima de medo nos agentes económicos passíveis de serem fiscalizados por aquela entidade, ou seja – quase todos. Numa sociedade ingénua e com poucos conhecimentos técnicos e jurídicos é relativamente simples impingir um produto (expressão minha) através de um argumento falacioso – o facto de ser obrigatório utilizar tal produto. Pessoalmente desconheço as “especificidades” de detergentes “específicos”, “especiais”, “próprios” e “certificados” que agora – “por causa da ASAE” – são de uso obrigatório.

2. Nada a apontar, estamos numa economia de mercado onde impera a lei da oferta e da procura e o vendedor estabelece o preço. Não posso é deixar de pensar de que se tratará, atendendo ao seu preço, dum excelente produto.

3. A encomenda aparenta ser o que é – detergente. A ficha de segurança não apresenta nada de extraordinário além das informações que já tinha referido. Considero, no entanto, dadas as características destes produtos, de que poderiam constar mais elementos informativos, tais como a sua capacidade bactericida, tempo de contacto, poder residual, entre outros. Uma pesquisa na internet sobre a empresa revela o que se temia – a sua inexistência. O contacto telefónico e o local correspondem a uma manicura.

Vamos às conclusões:
Pela referência à certificação da qualidade e aos dados das fichas de segurança facilmente se chega ao fabricante e ao produto. E isto acaba por ser uma golpada interessante e facilmente desmontável. Um espertalhaço compra um detergente banal, envolve-o com outro rótulo, arranja umas papeladas com outro timbre e, aproveitando a ingenuidade e a confusão criada pela ASAE, vende-o por 20 vezes o seu valor inicial.

O caro amigo, que porventura é proprietário dalgum estaminé e que veio aqui parar porque fez alguma pesquisa por “detergente obrigatório” e/ ou “ASAE“, é livre de comprar e de utilizar aquilo que bem entender. Eu, pessoalmente, tenho o dever de o alertar para a circunstância de que dar vinte e tal contos na moeda antiga por 5 litros de lixívia perfumada é capaz de ser… assim… tipo… exagerado. E que o amigo está a ser… assim… género… vítima de um embuste.

Não tenha receio dos maus e não alimente os vilões… seja bonzinho mas não seja parvo.

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2 Comments

  1. Tópico interessante e relevante.

    Aproveito para acrescentar que também é moda os mesmos que vendem os detergentes andar a dizer que o mesmo é exigido pelos serviços de saúde pública (pelo menos já conheço duas histórias do caso).

    Bem, se a lixívia (dos produtos mais antigos) dizem que “não serve”, porque não processar as empresas que as fabricaram durante tantos anos ? obviamente que se um produto É DESINFECTANTE… pouco nos interessa que “brilhe no escuro”.

    Mas pronto os bolsos do povo estao cada vez mais fundos e mais vazios:

    – Afinal, precisam dos desinfectantes “obrigatoriamente caros”
    – do HACCP que todos o podem fazer mas é “obrigatoriamente comprado”
    – controlo de pragas
    – analise maos, equipamentos, alimentos….
    – HST
    – bla bla bla ….

    estas questoes por vezes fazem me lembrar da quantidade de papeis higienicos que existem a venda.. normais.. normais dupla camada.. extra macios.. com cor… com cheirinho…
    Não pretendendo atingir ninguem, fica a opinião que o cu não sente o cheiro, nem ve a cor, nem as outras coisas todas.

    Fica uma mensagem de amor para os colegas. Façam o povo ter saúde pública, e não comprá-la.

    Afinal, é a Nós a que a Saúde Pública Nos Compete!

    O Sétimo Selo.

  2. Isto infelizmente é o pao nosso de cada dia. Além destes casos tambem existem as empresas de consultoria (muitas delas tambem vendem os produtos de higiene) que impingem a toda a força os serviços de HACCP.
    Até haver uma entidade que acredite estas empresas e as certifique (tipo ACT) vamos andar sempre nesta historia do Bom o Mau e o Vilao …., mas sem o Clint Eastwood!!!

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